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História da Igreja no Brasil


A Igreja dos Pobres

A história da Igreja no Brasil se confunde com a história da misericórdia, da compaixão para com os pobres, os doentes, os órfãos, os abandonados, os idosos, os prisioneiros. Praticamente todas as modernas instituições de atendimento social tiveram a gestação na Igreja.

Não poderia ser diferente, pois a vida da Igreja consiste na imitação dos gestos de seu fundador. Jesus foi o homem da compaixão sem limites: doentes, rejeitados da sociedade, pecadores públicos, famintos, prostitutas... dele receberam o olhar amoroso e a mão estendida. E isso é tão decisivo que o julgamento e a salvação dependem do que tivermos feito com os doentes, prisioneiros, famintos, peregrinos... (Mt 25).

A IGREJA, MÃE DOS SOFREDORES

Assim também foi e é a história da Igreja no Brasil: uma sucessão de obras de misericórdia corporais e espirituais. Passando pelas Santas Casas de Misericórdia, pelas Casas de Caridade, Asilos, Orfanatos, Escolas, missões entre os índios..., percebemos a presença de bispos, leigos, sacerdotes, religiosos e religiosas.

É evidente que nos dias de hoje houve uma evolução do conceito de caridade e cidadania, passando a cobrar do Estado muitas iniciativas que antes eram da Igreja. É missão do governo, que recolhe impostos, oferecer aos cidadãos meios de trabalho, moradia, estudo, saúde, emprego. Mas isso não impede que a Igreja tenha suas obras de misericórdia, sobretudo naquelas situações em que se exige verdadeira vocação para o atendimento.

AS RELIGIOSAS, IRMÃS DA CARIDADE

A mulher foi sempre a grande promotora da caridade, da assistência ao pobre. Aliás, a vida da Igreja é marcada pela presença da mulher. Junto com o leite materno, ela alimentou o filho com o leite espiritual. A catequese é obra da mulher, como também o é a organização das comunidades. Na década de 80, elas começaram, no Brasil, a Pastoral da Criança. Iniciada em Florestópolis-PR, em 1983, expandiu-se pelo Brasil e evitou a morte e a desnutrição de milhões de crianças. Foi resultado do ideal dos irmãos Zilda e Dom Paulo Evaristo Arns.

O ministério da caridade foi exercido sobretudo pelas religiosas, que até recebiam o nome de Irmãs de caridade. A Coroa portuguesa fazia restrições à vida religiosa feminina no Brasil. O motivo era a carência de mulheres na Colônia: um convento feminino, atraindo vocações, pioraria o quadro. O caminho encontrado pelos chefes de família brasileiros foi enviar as filhas para conventos em Portugal. Mas, em 1732, o rei impôs pesadas multas e prisão para o capitão de navio que levasse mulheres sem permissão régia.

A primeira experiência religiosa no Brasil aconteceu em Santa Catarina, entre 1538-1548, quando os freis Bernardo de Armenta e Alonso Lebrón fundaram, na atual Laguna, um Recolhimento para meninas indígenas. Seguiram-se outros em Pernambuco e Bahia. Não eram conventos, mas ofereciam a possibilidade de vida conventual.

O primeiro mosteiro brasileiro foi fundado em Salvador no ano de 1677. Em 1755, Salvador tinha sete casas religiosas, com 186 religiosas professas e, para servi-las, 499 escravos! Era um projeto religioso para as classes dominantes, com pouca austeridade e piedade.

As beatas tiveram outro tipo de vida religiosa. Tratava-se de leigas que vestiam o hábito da Ordem Terceira franciscana e passavam a vida na oração e na penitência. Chegavam a formar pequenas comunidades com espírito mais religioso e pobre do que nos conventos. Havia também as beatas peregrinas, não enclausuradas, que levavam vida apostólica, assumindo obras de caridade, como o trabalho com crianças.

Foi essa a possibilidade para a regeneração espiritual e social de mulheres prostituídas ou para as mulheres pobres que não tinham acesso aos conventos. Essas mulheres de vida religiosa autêntica escreveram uma bela página da vida católica brasileira.

A partir de 1849, chegaram ao Brasil as congregações femininas de vida ativa, dedicadas ao ensino e aos hospitais. Foram pioneiras as Irmãs de São Vicente de Paulo. Grande intuição foi a da Beata Madre Paulina que, em 1890, fundou em Santa Catarina a Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, cujo objetivo era a catequese, a caridade com os doentes, o ensino e a missão.

Cabe aqui recordar a inserção das religiosas nas CEBs, nos meios populares do interior, dos sertões brasileiros, entre os indígenas, onde são catequistas, médicas, conselheiras, enfermeiras, ensinam noções de higiene, saúde, etc.

Ir. Dulce, eleita pela revista semanal ISTO É "a religiosa do século 20", firmou-se no coração dos brasileiros como o Anjo dos Pobres de Salvador. Irmã Dulce concebeu sua obra como o refúgio seguro daqueles a quem nenhuma instituição queria receber.

IRMÃO JOAQUIM, O VICENTE DE PAULO BRASILEIRO

Nascido em Florianópolis, o Irmão leigo Joaquim Francisco do Livramento (1761-1829) tinha a espiritualidade centrada na devoção ao Santíssimo Sacramento e na consagração aos pobres.

Irmão Joaquim conseguiu reunir grupos de mulheres adoradoras do Santíssimo e criou muitas obras para o atendimento aos pobres e à infância desvalida. A ele deve-se a construção do Hospital Caridade dos Pobres, em Florianópolis, o Asilo para crianças abandonadas em Salvador, a Santa Casa de Porto Alegre...

Ele garantia a manutenção de suas obras viajando para a Europa; foi recebido por reis, vice-reis, governadores. Foi numa dessas viagens que Ir. Joaquim morreu na cidade francesa de Marselha. Ele tentou também promover a missão entre os índios, mas a burocracia não o permitiu.
Nunca aceitou ter escravos, fato raro em sua época. Vida de oração e de trabalho eram a força de sua ação.

Nos tempos modernos, a promoção humana na Igreja brasileira contou com a obra de Marcello Cândia (1916-1983), conhecido como "o empresário dos pobres". Proprietário de uma importante indústria italiana, vendeu-a e, em 1965, a convite de Dom Aristides Pirovano - Bispo de Macapá, transferiu-se para Amapá, aplicando sua fortuna na construção e manutenção de hospitais, leprosários, escolas, conventos... em diversos Estados brasileiros.

O trabalho de Marcello Cândia era marcado pelo espírito de bondade, caridade e santidade. Em 1995 foi aberto o processo para a sua beatificação.

AS CASAS DE CARIDADE DO PADRE IBIAPINA

O padre José Antônio de Maria Ibiapina, cearense nascido em 1806, foi promotor da vida religiosa no Nordeste. Em sua obra unia a espiritualidade missionária e a caridade. Ordenado sacerdote, viveu 28 anos como missionário no sertão onde pregava missões populares. Sua originalidade foi convocar o povo para obras comunitárias, como a construção de açudes, hospitais, escolas, cemitérios.

Fundou 22 Casas de Caridade em cinco Estados nordestinos, todas construídas com material local. Tudo isso ele construiu sem auxílio exterior, sem compromissos, sem apoio oficial. Não precisava, pois sua missão unia de modo claro a fé e a caridade, e convencia as populações atingidas.

Para conduzir essas Casas, apresentaram-se centenas de moças, com votos ou não, vocações locais, exercendo a função de enfermeiras, educadoras e evangelizadoras do povo. Um modo novo de viver a vida religiosa.

Ibiapina, já paralisado, passou os últimos 16 anos dirigindo e orientando suas fundações. Morreu em 1883. Infelizmente, os bispos nordestinos preferiram "importar" religiosas européias, dando pouca importância à obra original de Ibiapina, que teria dado outra feição à Igreja nordestina.
Pe. José Besen

Para Refletir

1.º Como se desenvolveu a ação caritativa da Igreja no Brasil?

2.º Quais são os destaques da atual ação social da Igreja no Brasil?

3.º Na celebração dos 500 anos foi reconhecida a presença silenciosa da Igreja na construção do Brasil?

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